Com o objetivo de levar conteúdo de saúde, tanto para seus associados quanto para a população em geral, a Diretoria Executiva da Associação de Medicina Intensiva Brasileira – AMIB Biênio 2022-2023 – desenvolveu a editoria “Bate-papo com ESPECIALISTA”, que tem como objetivo, trazer notícias em diversos formatos, destacando um protagonista em questão.
Periodicamente, sempre na aba de notícias do portal AMIB, a Diretoria Executiva convidará um Especialista para participar de uma rápida entrevista e esclarecer pontos importantes para o acompanhamento, da população, em relação a um tema específico de saúde.
Por conta da crise sanitária em que estamos passando, o tema não poderia ser outro, COVID-19. E, por esse motivo, convidamos o Dr. Carlos Roberto Ribeiro de Carvalho, graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP e doutorado em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP, desde 1995, exerce o cargo de professor associado/livre-docente da Universidade de São Paulo e a partir de outubro de 2012 passou a ser Professor Titular da FMUSP, Diretor da Divisão de Pneumologia do InCor do HCFMUSP, onde coordena a UTI-Respiratória e o Programa de Telemedicina do InCor , consultor de desenvolvimento do equipamento de Impedância Elétrica – TIMPEL SA. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Terapia Intensiva e Pneumpatias Intersticiais, atuando principalmente nos seguintes temas: ventilação mecânica, ARDS, PEEP, insuficiência respiratória, fibrose pulmonar, sarcoidose e linfangioleiomiomatose.
AMIB – Obrigado por aceitar o nosso convite, colega Dr. Carlos Carvalho. Sabemos que teve um grande envolvimento, junto com Ministério da Saúde, em documento de diretrizes para o tratamento hospitalar a paciente diagnosticado com COVID-19. O que poderia destacar para os nossos leitores?
Dr. Carlos Carvalho – Agradeço a oportunidade e convite para inaugurar essa editoria na AMIB. O documento de diretrizes foi um trabalho solicitado pelo próprio Ministério da Saúde, em um momento que se tinha diversas áreas produzindo documentos em diferentes frentes, havia ainda a necessidade de criar um documento único. Foi o momento de desenvolver um material unificado, que abrangesse toda equipe multiprofissional, não só em grandes hospitais, mas de forma que conseguisse atender em lugares distantes, com estrutura reduzida e serviria, também, para orientar o paciente e a população. A premissa era que todo o documento fosse elaborado com base nas melhores recomendações nacionais e internacionais baseados nos melhores estudos científicos que pudessem servir de orientação/diretriz para as equipes de saúde e população no geral.
AMIB – Qual era o real objetivo dessas diretrizes?
Dr. Carlos Carvalho – O objetivo era delinear uma linha de cuidados para o paciente com COVID-19. O diagnóstico, nesse momento, não havia sido solicitado, portanto, não fez parte da diretriz. Tampouco foi solicitado a profilaxia, seja ela primária ou secundária, como por exemplo, o uso de vacinas, uma vez que isso já era ponto pacífico por parte do Ministério da Saúde.
AMIB – Em qual momento partiria a linha de cuidados?
Dr. Carlos Carvalho – Ela partiria do momento que o paciente tivesse sintomas compatíveis com os da COVID-19 e procurasse um atendimento médico em pronto socorro, unidade básica de saúde ou unidade de pronto atendimento. Na época, existia o problema pela falta de oxigênio, então iniciamos orientando da maneira mais direta e objetiva possível: quando, quantidade e qual forma o insumo poderia ser utilizado.
AMIB – Caso isso não fosse suficiente, quais seriam as recomendações?
Dr. Carlos Carvalho – A indicação de cateter de alto fluxo e ventilação não invasiva. Em resumo, quando isso não fosse suficiente, seguiria para a intubação e a colocação do paciente em ventilação mecânica, o tratamento farmacológico intra-hospitalar, o tratamento hemodinâmico do indivíduo dentro da UTI, a sedação, analgesia e bloqueio neuromuscular durante a ventilação mecânica. Todos esses tópicos foram amplamente discutidos do ponto de vista das equipes de professores, pesquisadores, profissionais dos principais hospitais que vinham dando apoio ao Ministério da Saúde e, principalmente, com profissionais indicados pelas sociedades médicas, como a própria AMIB, por exemplo.
AMIB – Quais outras sociedades foram envolvidas?
Carlos Carvalho – Juntos, somamos mais de 200 participantes, centenas de horas/homem de trabalho voluntário e dezenas de laudas produzidas. Quero aproveitar e agradecer a importante contribuição de todas as pessoas que me apoiaram ao longo dos últimos oito meses. Respondendo à pergunta, tivemos o envolvimento da Sociedade Brasileira de Cirurgia Vascular que participou da discussão de anticoagulação, AMIB, Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Sociedade Brasileira de Infectologia, Associação Brasileira de Medicina de Emergência, participaram de todos os tópicos. Já, demais sociedades, como a Vascular citada anteriormente, participaram de tópicos específicos, com a Sociedade Brasileira de Cardiologia, que participou da parte hemodinâmica.
AMIB – Como foi a solicitação do tratamento farmacológico pré-hospitalar da COVID-19, assunto visto amplamente hoje na mídia?
Dr. Carlos Carvalho – Em meados de 2021, a Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde – do Ministério da Saúde – solicitou a discussão do tratamento farmacológico pré-hospitalar da COVID-19. Nesse momento, foi criado um outro grupo para esse estudo, bastante aprofundado e, uma vez aprovado nesse grupo de professores e pesquisadores, foi submetido para aprovação na Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – CONITEC. Apesar de aprovado por unanimidade na CONITEC, não foi publicado. Para não publicar esse tópico isoladamente, foi realizada uma consolidação com demais documentos enviados há mais de seis meses atrás, com o argumento de falta de atualização. Foi a primeira vez que uma diretriz não foi publicada, apesar de validada pela CONITEC.
De tudo que foi discutido, a parte medicamentosa e o tão falado Kit Covid, é apenas uma pequena parcela dentro de uma quantidade enorme de informações que nós levaríamos para a polução brasileira, principalmente para o profissional da saúde que estaria na ponta para poder se basear em um documento robusto, baseado na ciência. Tal documento que o governo decidiu não publicar por não recomendar o kit covid.
AMIB – Algo que gostaria de ressaltar?
Dr. Carlos Carvalho – Como dito anteriormente, foi um trabalho grande e extenso, todos os profissionais envolvidos trabalharam de maneira voluntária, com único interesse de ajudar a salvar vidas. Novamente, agradeço a oportunidade e, agradeço também, todos os colegas que contribuíram e me ajudaram nesses últimos meses.